domingo, 29 de dezembro de 2013

BOM DIA TOM WATTS * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ

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BOM DIA TOM WATTS
*&*&*
Hoje eu acordei
cumprimentando Tom Watts,
que um pouco mais que eu
empenha a vida inteira
na luta contra injustiças,
seja nos states
ou em qualquer outro lugar.

Ele, bem mais que eu,
sabe que Bertolt Brecht
morria pela dialética
e não temos nada contra
até porque nós dois
temos cá nossos modos
de também morrer pela dialética.

Aliás, ambos apoiamos
com o nosso melhor fervor
o direito inalienável
de cada um escolher
a morte que bem entender,
sobretudo os amigos do alheio.

Mas todos nós sabemos,
a sós ou na multidão,
que em termos de dialética
ela nos torna senhores
dos nossos sonhos e escolhas
e eu quase tanto quanto ele
exponho nossa bandeira:
NÓS LUTAMOS PELA VIDA!
*&*

sábado, 21 de dezembro de 2013

ADEUS REGINALDO ROSSI * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ

ADEUS REGINALDO ROSSI
*
Ninguém imagina como
mas um dia eu
briguei com Reginaldo Rossi.
Foi uma briga feia,
rolou peixeira, empurra-empurra,
rabo-de-arraia até
a turma do deixa-disso se meter.
Eu já tinha bebido não sei quantas,
tava bem prá lá de Bagdá,
tinha acabado o cigarro
meu e do bar,
devia ser umas três da matina,
e o Reginaldo, dono do bar,
veio me dizer
que só tinha esse disco;
ninguém pescava por quê
só tocava "garçon"
na sua vitrola,
foi quando eu perdi a linha,
ameacei não pagar a conta
e levantei-me pra sair,
aí ele explicou-me
que o disco estava arranhado
e só escapara aquela faixa!
Mas o "próprio" acaba de partir...
E agora,como vou brigar
com o Reginaldo Rossi?
*&*

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

DA ARTE DE TORTURAR CRIANÇAS * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ

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Dia desses eu atravessei a cidade, fui lá pros confins da zona oeste, na casa de um amigo, fechar uns textos que tínhamos de encaixar numas publicações. 
É que esse negócio de e-mail prá lá e-mail pra cá não funciona. 
Saltei do ônibus e lá estava ele no ponto encostado na sua Harley Davidson, de estimação. Engarupei-me e partimos pelo baixadão de Raíz da Serra. O desconforto era imenso. Não suporto andar de moto, inda mais na garupa. Ao chegar em sua casa, notei que estávamos tensos, fosse pelas responsabilidades ou pelo trajeto desagradável.
 Sem querer aporrinhar, pedi-lhe um copo d'água, e ele trouxe uma garrafa com dois copos e sentamos à mesa da sala. Ele pegou seu notebook, eu abri o meu e liguei e fomos corrigindo textos, acertando frases e períodos; plantando massetes aqui,  ali expressões jornalísticas, alguma gíria linguística, e, às vezes ríamos, porque sabemos que isso vai dar lenha; neguinho vai ter que ir ao "burronário" pra decifrar um pouco, pouco apenas, porque tudo não dá...Estamos matando à unha.
Suas crianças, três, um menino e duas meninas, se encastelaram na mesa; cada uma com seu  " ai...bolso!"; é claro que atrapalha. Ele já está irritado com elas, pois manda sair, ir para os seus quartos, para a varanda, para o quintal, mas elas repicam que "eu sou muito legal" e querem saber se eu vou contar história pra elas hoje. É tio Cabral pra lá e tio Cabral pra cá...Não tem jeito! Mas ele resolve pôr o menino de castigo; tem 4 anos, é muito esperto, "brinca" com um computador! 
Ele foi para o quarto chorando, prometendo que vai esperar para o Tio Cablal lhe contar história, o que asseguro fazer. Enquanto isso, eu e J, como vou apresentar meu colega, uma vez que se trata de gente real e não ficção, comparamos textos nossos com textos de Carlos Heitor Cony e Luiz  Fernando Veríssimo, procurando tirar uma casquinha nos papas da crônica. Mas eis que de repente começamos a ouvir uma voz tipo Mônica....mããe, a senhola qué mãe de Jesus, me adiuda, a senhola pode, é mãe de Jesuus, fala com meu pai pla eu blincar com mias ilmãs lá na valanda, diiii pla ele que noão agluento ficá pleso no esculo...vai! Eu olo pla senhola todo dia....
 Ao ouvir isso, J não aguentou e foi rápido para o quarto do menino, pegou-o nos braços e pediu desculpa, enquanto ele agradecia a Nossa Senhora dizendo " a senhola é lápida hein! Eu vou olá mais! Obligado!!" e beijou o pai, que caiu no pranto.
J, assim como eu, somos de raíz católica, temos nossos lares cheios de símbolos de nossa formação religiosa; Cristo na cruz, esculturas de igrejas barrocas, Santo Antonio, São Jorge, São Francisco de Assis e, impreterivelmente, imagens de Nossa Senhora pela casa toda. É o caso do quarto do menino dele, que ostenta um quadro da Virgem vindo de sua Avó, Dona Olinda, descendente de italianos franciscaníssimos. É aos pés Dela que ele reúne-se com esposa e filhos para orar ao fim dos seus dias. E é por isso que o pequeno P sabe se dirigir à Santa.
Mas, conclusão: Ele, como torturador, não faturaria nem um café!

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

COISA DO ROMA - CRÔNICA * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ


Nós sabemos o que é isso, essas expressões que o povo cria, como "coisa do fulano, ah, cheira a sicrano, a "coisa do roma" se incorporou à vida do povo de Itapema. Mas quem vê o mar de Itapema, litoral norte de Santa Catarina, pensa em Itapoã - BA, Ipanema - RJ, tamanha a sua beleza, só não imagina que vai encontrar pelas ruas um deficiente heróico: O Roma!

Roma é como se apresenta o Senhor Francisco Carlos Roma. É pescador aposentado, e ninguém tomaria conhecimento da sua existência não fossem as suas aventuras sobre uma cadeira de rodas, motorizada.

O Roma, como dizem os habitantes do lugar, dá de cem no Felipe Massa! Ninguém entenderia como sem pesquisar um pouco sobre a sua "Cadeira de Rodas". Acontece que o nosso personagem, como todo bom pescador, desenvolveu habilidades especiais, após uma vida "inteira" consertando barcos de pesca, às vezes em alto mar.

Porém, em 2004, aos 24 anos, de tanto " dar uma " de engenheiro, sofreu uma descarga elétrica e o resultado foi a perca de um braço e as partes inferiores das duas pernas. Ou seja, invalidez aos vinte e quatro aninhos. Isso na cabeça de quem sempre desafiou os perigos, pode ser o fim!

Mas o Roma não é brinquedo não (!), diz o sorveteiro da praia, enquanto ele explica que graças a seus conhecimentos de engenharia mecânica, adaptou sua cadeira com um motor 125 cilindradas, pôs freio  e rodas de moto, e anda todo esse mundão de meu Deus em cima da "locomoção que eu fiz!"

Sua fala demonstra todo um elevado grau de auto-estima, auto-confiança, força interior, capaz de emocionar quem lhe ouve contar suas façanhas. E só isso explica as peripécias pela BR101, aonde foi filmado fazendo ultrapassagem em alta velocidade sobre cadeira de rodas.

Não ficou barato, exclama nosso herói, que detalha o "processo" que sofreu, a "prisão" da cadeira pela polícia e a reprimenda perante o juiz, de que se repetisse aquilo, ficaria sem o seu veículo!
Agora vejam-no sobre rodas:
* - ACF é escritor e poeta, morador de Jacarepaguá e editor do blog letrastaquarenses.blogspot.com.br  
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quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

SOBRA DE RAZÕES * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ

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Quisera ser guerrilheiro
dias e noites selva adentro
montes e vales regados a suor
 comida por prêmio
 água por descoberta
 sono por conquista
da meta atingida
tudo para mudar o mundo
com as massas de arma em punho
como quis Chê Guevara
ser odiado pelos imperialistas
e os sanguessugas de plantão
procurado como agulha no palheiro
por idiotas armados até aos dentes

E no entanto olha eu aqui
sentado com o político mais corrupto
da minha pobre cidade
solicitando coleta de lixo
para as ruas do meu bairro
como um reformista manso
em nome dessa gente indefesa

Mais um dia e eu ainda
sigo Malatesta
arranco o pino da granada
latente em meu peito
junto com Bakunin
e perco essa paciência de Jó
mesmo que ninguém 
entenda o meu gesto Artaud
e pense que eu mandei pros ares
a câmara cheinha de vereadores
simplesmente porque andei lendo demais
batendo papo com Leminski
ouvindo Violeta Parra
na madrugada sem sono
falando sozinho na cozinha
enquanto a família dorme sossegada
ou coisa assim...
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sexta-feira, 29 de novembro de 2013

ETERNA CANÇÃO DOS BECOS * Antonio Cabral Filho

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Becos que canto no verso
sem fazer questão do metro
sem nenhuma pretensão
nem mesmo de sifilítico,

Becos das minhas certezas
e das ilusões perdidas
em leitos profissionais
nas vielas do Estácio,

Dos sarros bem tirados
no cine Pinto Azevedo
e tantas trepadas em pé
nas quebradas do São Carlos,

E tantas outras 
no campinho da Mineira
e outras tantas ainda
no Cemitério do Catumbi,

Sem contar as noites quente
com a Marisa do Charrão
no alto do Querosene
sobre uma esteira no chão.

Becos do Beco da Fome,
menina dos olhos de Copa bacana
e alegria de altos e baixos Leblons,
onde a fama do prazer
tira o atraso da galera.

Becos que ninguém cantou,
nem no dístico nem no tríptico
e quiçá numa quadra,
mesmo com elipses mentais,

Eu vos empresto minha alma,
mas com a mineira sisudez
em olhar só de soslaio
cá do Largo do Boiadeiro.
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sábado, 2 de novembro de 2013

LAVADEIRAS DO RIO DOCE * Antonio Cabral Filho

Todo dia bem cedo
Seguem levas de lavadeiras
Com as trouxas na cabeça.
Cada uma leva consigo
Um punhado de farofa no embornal
Para a boquinha necessária.
Todas possuem por costume
Vasto repertório de canções
Para a hora da esfrega,
Que entoam com voz meiga
Enquanto vão-se calmas
As águas do Rio Doce.
E as lavadeiras do Rio Doce,
Com suas canções de alvejar
Lavam a roupa mais alva
De que dão-se notícias
Por todas as redondezas
Espalhando tanta fama.
Mas isso pode ser visto
Na hora do sol a pino
Estendido nos varais.
É brancura de doer
As vistas do transeunte
Da BR 116,
E, segundo as línguas de trapo,
O boto tem sido acusado
De andar por aquelas bandas,
De ser o maior come-quieto,
Pois vive entoando canções
De enfeitiçar lavadeiras,
E possuí-las durante o sono
Sob os ingazeiros floridos
Perfumando o entardecer.
Enquanto lençóis branquíssimos
Brincam de pique com o vento
Nos sonhos das lavadeiras.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

CRÔNICA DOS VIVOS * ANTONIO CABRAL FILHO


(Seu Zé, o José Fernandes Bastos)
Aposto que ninguém sai de casa pra visitar uma banca de livros no meio da calçada, há mais de vinte anos. Pois é, eu saio. É que às vezes dá uma secura danada de encontrar novidades. É, novidades. Novidades porque as minhas não estão nas livrarias de best-sellers, nas listas dos mais vendidos, no bate-boca de pessoas frívolas ou nas mãos de alguém burguês o suficiente pra ter tempo de ler porcaria, puramente pra matar o tempo, pra dar sentido à sua ociosidade. É por isso que eu saio de casa, pego o ônibus, atravesso Jacarepaguá "todinho" e vou lá na Freguesia, visitar meu amigo José Fernandes Bastos, nascido, segundo ele, em 1922; no Rio desde 1948 e aposentado há mais de trinta anos, quando se tornou jornaleiro ali no calçadão da Freguesia. Ele diz que foi mensageiro de hotel, mas acabou garçon porque a gorjeta era melhor. Mas reclama que parou de trabalhar com jornais porque tinha que buscar de madrugada, não podia tirar folga, feriado, fim de semana, dia santo etc, nada! E que então começou a comprar livros usados e transformar a banca numa "livraria", só pra tirar um "lucrim" e pronto!
Pois é, foi por isso, de tanto passar por ali e puxar uma prosa com ele que acabei me apegando. Virei amigo, segundo ele. Mas eu me perguntava cá aos meus botões, como é que esse "cabra lá da terrinha" pode vender livros, será que ele conhece alguma coisa, entende do que está vendendo, e, certa vez cutuquei, de leve, o "caboco" usando, pra isso, o Fernando Pessoa. Foi assim: Eu cheguei na banca e vi um livro do portuga e xinguei o pai dele, dizendo que era um pai muito burro, que isso era mesmo coisa de português, não ter sequer um sobrenome decente pra colocar no pobre do filho, além de deixá-lo órfão. Seu "Zé" olhou-me ressabiado, querendo entender o quê que eu estava falando e quando eu lhe pedi o livro do Fernando Pessoa, ele fitou-me sério e perguntou se era dele que eu estava falando. Claro! Respondi. Já pensou você se chamar José Gente? João Humano? Maria Humanidade? Pedro Homo Sapiens? Disparei logo um monte de disparate, mas me preparando pro contra-taque, que veio rápido: Este aqui não precisa sobrenome; é como Sócrates, Platão, Aristóteles, Aquiles! Basta-lhe Fernando, e se fosse apenas "Poeta", arremataria tudo! Meus botões me avisaram que seria melhor jogar a toalha, puxar uma "tangente" pra ficar tudo em banho-maria; perguntei o preço do livro, regateei até cansá-lo e enfim paguei o que ele queria, mas guardei a lição: Ele sabe o que vende.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

NOTÍCIAS DE RILKE * Antonio Cabral Filho

NOTÍCIAS DE RILKE

Meu primeiro contato com Rainer Maria Rilke  foi através do livro Elegias do Duino. Gosto do livro, até porque no momento da primeira leitura eu acabara de livrar-me dos poemas da Cecília Meireles escritos durante e após sua viagem à Índia.

Minha passagem à leitura de Rilke deu-se basicamente por isso: Pensar que ele fosse místico. Em parte eu estava certo, pois constatei em toda sua temática, ao longo de sua obra, a força dos poemas escritos sobre companheiros mortos, elegias a assuntos religiosos, réquiens por isso e por aquilo etc, mas não foi isso o que me fez esbarrar  com a sua poética, porém, basicamente, o contrário; ou seja, o fator materialista, como ele encara o labor poético.
Ao dizer isto, remeto-me à polêmica anacrônica a respeito da poesia aceitar ou não ser um assunto “sistêmico”, isto é, se ela aceita ou não conceitos filosóficos, enquadramentos ideológicos, aplicabilidades de caracter etc, tais como poesia idealista, materialista, religiosa, amorosa etc e afirmar aqui com todas as letras, que ISSO não me interessa, exatamente por considerar que qualquer tipo de obra estética é fruto do espírito humano e só será “objeto” a partir de uma escolha pelos indivíduos, mais nada.

Após deixar isso registrado, quero convidar a todos para conhecer a poesia de Rilke sem essas maniqueisses, como o faria também com dois grandiosos poetas brasileiros: Murilo Mendes e Jorge de Lima.  Mas o Rilke fez-me refletir sobre isso ( tudo!) por uma questão simples, um poema dele que chamou a minha atenção. O poema fala sobre a atitude dos poetas frente ao mundo, frente a si próprios e frente ao labor poético. É mais um dentre tantas ELEGIAS E RÉQUIENS DO RILKE, onde canta com bravura e fala da tão cantada ”oh velha maldição dos poetas” criticando exatamente a atitude conservadora  assumida , ainda , pela maioria das pessoas denominadas “poetas “ , que ao invés de se lamentarem perante ao mundo, à vida, às questões que afligem ao modo de vida e as atitudes que a tudo dizem respeito, deveriam mirar-se no exemplo da grama que transpõe a pedra e vai buscar o sol lá fora das grades dos jardins.

Na época em que ralava para encontrar informações sobre Rilke, entre os anos de 1978 e 80, me debatia sofregamente para colaborar nos Suplementos Literários, que pipocavam pelo país, mais ocupados em publicar aqueles que lhes dessem maior visibilidade dentre as panelinhas; mas aconteceu algo que eu jamais vou conseguir entender: Um poema meu saiu no Suplemento Literário Minas Gerais.
 
Não sei se o que tomou conta de mim pode ser chamado de EUFORIA, mas eu fui ao jornaleiro defronte ao edifício Avenida Central, na Avenida Rio Banco, 176, e comprei todo o estoque do Estado de Minas Gerais; saí distribuindo aos amigos, na Uff, onde cursava direito; no Curso Santa Rosa, Largo de São Francisco, onde cursei contabilidade, na Escola de Teatro Martins Penna, por onde passei e em todo o ambiente cultural carioca, muito agitado na época pela chamada Poesia Marginal, principalmente pelos Grupos Trote, Nuvem Cigana e Navilouca.

Mas coisa de um mês depois eu fiquei estupefato: Chegou-me um chamado do Correio para ir retirar uma remessa e lá fui eu munido de documentos e apreensões. Ao chegar no guichê, identifiquei-me para a funcionária. Ela foi lá dentro e voltou com um recibo para eu assinar. Era dinheiro e dizia tratar-se de Direitos Autorais sobre a publicação do meu poema Odor Primitivo pela Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais. Assinei e saí “explodindo” de felicidade. Eu nunca tinha experimentado uma sensação daquela: Receber Diretos Autorais!

Portanto, era “EUFORIA” sim o que eu sentira ao ver meu poema publicado, e  receber por isso já era demais! Fui direto à Livraria Camões e comprei os livros que eu mais “namorara” naqueles últimos meses e custavam mais de um salário mínimo, mas adquiri a Obra Completa de Rainer Maria Rilke

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

HISTORIAS DE NEGRINHO * ANTONIO CABRAL FILHO - RJ

Foto: ASSÉDIO MORAL O QUE É O assédio Moral é qualquer forma  de violência psicológica e moral no trabalho, expondo o trabalhador a situações humilhantes, vexatórias e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções. Esta prática atenta contra  a dignidade e a saúde física e psicológica da vítima e compromete a carreira profissional do trabalhador.  AS FORMAS DE ASSÉDIO Muitos indivíduos são vítimas de assédio moral e não sabem. Há várias formas utilizadas pelo assediador, algumas tão sutis que os demais colegas podem não perceber : ameaças constantes de demissão, ofensas, sobrecargas de trabalho, intimidações como chamar a atenção publicamente, apontar o dedo indicador para o rosto da pessoa, fazer gestos obcenos em direção à pessoa, dificuldades criadas para a execução da função, isolamento ou desmoralização publica do funcionário, desvalorizar o trabalho realizado, impedir os colegas de conversar ou cumprimentar a vítima etc. É considerado também como assédio moral desviar o trabalhador de suas funções originais sem justificativa, ou insistir que cumpra tarefas de dificuldades superiores  ou muito inferior ao seu conhecimento e função, com a intenção de humilhá-lo e hostilizá-lo. Sugerir ao trabalhador que peça demissão, divulgar boatos sobre a sua moral, advertir em função de  ausências por motivos de saúde ou porque reivindicou os seus direitos, estão inclusos entre as formas de assédio moral.  O QUE PODE ACARRETAR  A vítima de ASSÉDIO MORAL tem sua identidade, dignidade e relações afetivas e sociais comprometidas, com prejuízos à sua saúde física e mental que podem repercutir negativamente em seu desempenho profissional. O assédio pode levar o indivíduo a sofrer estados profundos de depressão, ausência de autoestima, vergonha, mágoa, revolta, raiva e, em alguns casos, pode resultar em suicídio ou levar à morte por doenças causadas ou agravadas por esta prática. Obs: Este texto foi encontrado na parede do banheiro do ASSAÍ CAMPINHO e foi entregue pelo Prevenção Henrique, que se demitiu por depressão.)  COMO ENFRENTAR O primeiro passo tem que ser a reunião de testemunhas, pelo menos duas; o segundo passo, contratação de um advogado e, o que é fundamental, o terceiro passo: deixar o assediador à vontade, pois é importante que ele continue agindo da mesma maneira, para não descaracterizar a SITUAÇÃO.

Não sei como ocorre com os outros a apropriação de um tema. Sei comigo, das minhas dúvidas interdisciplinares, perguntas sem respostas vindas lá da mais tenra infância, quando via meu pai humilhando empregados da fazenda onde ele era apenas um encarregado sem importância, e eu me inquiria do " por quê " de os outros serem obrigados a trabalharem mais rápido e ele não se dignar a ajudá-los, carregando sacos de seriais também.
Lembro-me que certa vez apanhei porque pusera um saco de milho no carrinho de mão e o levara até ao caminhão para o ajudante jogá-lo para cima. Lembro-me como ele gritou " cê num é ninhum nigrinho! ".
Daí em diante, essa palavra cravou em minha alma e muitas vezes ela queimou o meu rosto, fosse fazendo frete nas feiras livres, fosse virando concreto nas obras, ao ser discriminado por ser um "Nigrinho".
Mas cada vez que tive oportunidade, fui estudando no folclore brasileiro e na história social do país, a presença de casos envolvendo o povo negro, sobretudo as crianças. O mais emblemático deles, para mim, é o Negrinho do Pastoreio, que podemos conferir abaixo...
"O Negrinho do Pastoreio é uma lenda afro-cristã. Muito contada no final do século XIX pelos brasileiros que defendiam o fim da escravidão. É muito popular na região Sul do Brasil.
Na versão da lenda escrita por João Simões Lopes Neto, o protagonista é um menino muito negro e pequeno, escravo de um estancieiro muito mau; este menino não tinha padrinhos nem nome, sendo conhecido comoNegrinho, e se dizia afilhado da Virgem Maria. Após perder uma corrida e ser cruelmente punido pelo estancieiro, o Negrinho caiu no sono, e perdeu o pastoreio. Ele foi castigado de novo, mas depois achou o pastoreio, mas, caindo no sono, o perdeu pela segunda vez. Desta vez, além da surra, o estancieiro jogou o menino sobre um formigueiro, para que as formigas o comessem, e foi embora quando elas cobriram o seu corpo. Três dias depois, o estancieiro foi até o formigueiro, e viu o Negrinho, em pé, com a pele lisa, e tirando as últimas formigas do seu corpo; em frente a ele estava a sua madrinha, a Virgem Maria, indicando que o Negrinho agora estava no céu. A partir de então, foram vistos vários pastoreios, tocados por um Neguinho, montado em um cavalo baio.1"
Poderia lhes contar inúmeras histórias sobre o "aparecimento" do Saci ou porque só apresentam o capeta como um preto, mas vamos deixar isso pra depois. Quero lhes mostrar algo mais. Como morador de Jacarepaguá, gosto de investigar certas histórias. Daí, fui fazer uma pesquisa sobre a Santa Nossa Senhora da Penna, cuja igreja fica no topo da Pedra do Galo, Freguesia, e venerada como protetora dos escritores e jornalistas. Leiam: "Narra a lenda que um pequeno escravo perdeu de vista a vaca que tomava conta, sendo ameaçado de punição por seu senhor se não a encontrasse. Muito aflito, o menino pediu ajuda à Virgem Maria. Nesse exato momento do alto da Pedra do Galo, surgiu Nossa Senhora apontando para o lugar onde se encontrava o animal desaparecido. O milagre foi presenciado pelo fazendeiro, que, em agradecimento à Virgem, mandou construir a ermida e alforriou o escravo.( Aventura na História de Jacarepaguá, pag 95, Waldemar Costa )"
Vejam como a presença do Negrinho se faz forte na construção do imaginário escravista, apresentando mais uma forma de subjugar o negro desde as suas raízes, a infância. Neste caso aqui, a semelhança com o Negrinho do Pastoreio é total.
Mas tudo isso só vem configurar o modo "natural" de usar o negro como estigma de submissão, da mais escrachada expressão de racismo, evitando expor grandes exemplos da escravidão europeia  anglo-saxônica, que produziram grandes rebeldes, como Robin Hood, conhecido por roubar dos ricos para dar aos pobres, o que leva-me a perguntar "Por que não apresentar um herói branco, que foi submetido por seus iguais? Qual é o problema, é a cor?" E eis que me deparo com a imprensa toda apresentando o mais novo exemplo de escravidão infantil negra, criado pelo grupo econômico que ocupa o quarto lugar na grade dos maiores do continente americano, decorando a área de padaria de suas lojas com a figura de um NEGRINHO: O Grupo Pão de Açúcar.
*&*

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

POEMA SÓLIDO * ANTONIO CABRAL FILHO

Foto -Marshall Berman
POEMA SÓLIDO
Antonio Cabral Filho

Inútil Marshal Berman
e sua carona descarada
dançar fox-trot
sobre uma frase de Karl Marx,

pois ele não sabe
o que é sólido
sob a ótica marxista,

não sabe da solidez do poema
quanto Marx da marmita azeda,

não sabe da solidez do poema
quanto o operário e o patrão
sabem do relógio de ponto,

não sabe da solidez do poema
quanto o engenheiro do concreto
que sustinha as Torres Gêmeas,

não sabe da solidez do poema
que não se desmancha no ar
como fez o World Trade Center,

não sabe da solidez do poema
quanto o suicida do avião
em onze de setembro de dois mil e um,

não sabe da solidez do poema
que manda tudo pelos ares
sem Marshal Berman, nem suicidas nem Marx,

não sabe da solidez do poema
que manda tudo pro inferno
junto com George Bush e Osama Bin Laden,

não sabe da solidez do poema
que toma café à janela
na tarde de domingo chuvoso
feliz com o viço da plantação.

domingo, 15 de setembro de 2013

LENDAS DO AMOR * ANTONIO CABRAL FILHO

Há muito não visito Niterói. Mas o Araribóia continua o mesmo. Os meninos de rua também. Agora, a estação das barcas não tem mais cobertura, não tem mais conforto para os visitantes, moradores de rua, assaltantes de tocaia, pedintes, vendedores de bugingangas, butecos ordinários, cambistas de bilhetes lotéricos etc, mas se eu chegar na cidade que já foi capital do estado e não ir a Gragoatá, perdi a viagem. 

Só que hoje eu empaquei. Parei no portão da UFF e fiquei olhando o ir e vir de estudantes, coisa que eu já fiz também. E lembrei-me dos romances que "assisti". É verdade, eu "assisti" muito romance na vida universitária. Alguns marcantes. Outros mesquinhos. Mas tem um que deixou lembranças tristes. É que um amigo meu, o Almiro, conheceu uma menina, a Samira, estudante de psicologia. Eles se apaixonaram tanto um pelo outro que parecia uma doença. Brigavam de tirar sangue um no outro. Não foram poucas as vezes que, nós, os amigos, tivemos que nos intrometer e separá-los, porque estavam machucando um ao outro. E, tão logo eram separados pela "plateia", se refugiavam no banheiro e iam trepar. Muitas vezes nos maldizemos por tê-los separados por ficar de cara-grande, envergonhados...
Mas num domingo desses qualquer a turma marcou de se encontrar na Praia das Flechas, em frente a Pedra da Itapuca. Todo mundo levou comes e bebes. Só que não contavam com a presença do casalzinho para criar problemas; ou seja, eles sabiam da rejeição da turma pelo comportamento deles. Toda a turma sabia, também, que ambas as famílias não aprovavam aquele envolvimento de uma mulher lá com seus trinta e um menino na altura dos 19, o que lhes causava certa dificuldade para ficar juntos, pois não dispunham dos equipamentos familiares. Ou seja, de certo modo, sofriam com o romance e a repulsa de todos os lados. 
Isso leva-me a pensar naqueles "amores doentios", coisa de Camilo Castelo Branco, William Shakespeare, Gabriel Garcia Marques e cia... mas sem a "entourage" dos mesmos. Lembra-me também dos lacanianos, freudianos, reichianos, que fizeram "escola" às custas desses amores mesquinhos, a ponto de gerarem receita aos espertalhões do divã...alô Dr Gikovate!
Já vendi muito livro desse Autor para garantir meu pão-de-cada-dia. Mas, segundo a turma, eles chegaram na praia por volta das dez; uns foram montar as barracas, outros pôr as bebidas para gelar enquanto as meninas preparavam suas toalhas e esteiras para pegarem um bronzeado.
Quanto ao "casalzinho", ninguém se metia no roteiro dele; mas nem demorou a surgir o primeiro "inquérito", pelo fato de ela querer ficar pegando sol e ele quer mergulhar; rolou um empurra-empurra, me pega-me larga, me-deixa-me-solta, mas nada que a turma-do-deixa-disso não pudesse resolver. 
Devido à ocupação do pessoal com os preparativos pré-mergulho, ninguém notou o desenrolar das coisas do "casalzinho"... só que ninguém percebeu que a "digníssima" estava sentada na areia, bem na beira da água, com a cabeça sobre os joelhos e os braços cruzados em torno do rosto, tremendo e soluçando. A razão foi notada quando  a dita apontou para a Pedra da Itapuca, e, gaguejando, disse que ele pulara; depois de muitos soluços, conseguira dizer que ele não voltou... A colega chamou a atenção de todos e alguém meteu a cara n'agua e foi ver se encontrava o Amigo Almiro. Mergulhou uma vez e voltou e nada; mergulhou outra vez e voltou e nada; dado ao cansaço, outro mergulhou e voltou e nada; mergulharam mais dois e voltaram e nada; e a turma foi mergulhando... até que alguém teve a ideia de chamar o Corpo de Bombeiros, que dado ao fato da cidade ser pequena, chegou rápido e foi logo descendo. Dizem que desceu várias vezes, até que num dado momento um bombeiro subiu com um corpo e perguntou se era ele. O desespero tomou conta. Choradeira geral. Gritos, pragas e ódios vieram à tona; amigos se desentenderam, excessos e xingamentos, mas alguém exigiu respeito e todos se calaram: Era o corpo do meu amigo Almiro, que segundo Samira, mergulhara pelo amor que ele tinha por ela.

Não vou perturbar o seu juízo com minhas lembranças do Amigo, que sempre ficava sentado ao meu lado tocando e cantando Faroeste Caboclo, nem que durasse o dia inteiro; porque era a única música que ele conseguia "tirar" do violão pelo fato de estar no início do curso de cordas na Escola de Música de Niterói. Era uma pessoa promissora, de bom caracter, politicamente independente, cantor e compositor natural, poeta de mão cheia, mas vou deixá-lo com a LENDA DA PEDRA DA ITAPUCA, dado à semelhança mitológica do romance do "casalzinho":
PEDRA DA ITAPUCA
*&* 
Localizada ao largo da Praia de Icaraí 
Trata-se de um monumento natural localizado entre as Praias de Icaraí e das Flechas, sob a designação indígena de Itapuca (pedra furada) por haver tido, em sua forma original, um túnel natural. A pedra foi parcialmente demolida por ordens do Presidente da Província, Conselheiro Pedreira, para dar prosseguimento ao Plano de Arruamento de 1840-1841, criando uma comunicação direta entre os bairros de Ingá e Icaraí.
A "pedra furada" é apenas conhecida através de uma pintura a óleo sobre madeira, de 17 cm x 30 cm, atribuída a Julius Mill. A atual imagem da Itapuca foi, posteriormente, largamente reproduzida. Na República, o Tesouro Nacional fez um ensaio nas oficinas de gravura da Casa da Moeda do Rio de Janeiro, de papel-moeda do valor de 200$000Rs. (duzentos mil réis). Esta mesma paisagem foi escolhida pelo Barão do Rio Branco para seu ex-libris. Também apareceu reproduzida em selos do Correio, em tiragem de dois milhões de unidades, posta em circulação em 2 de abril de 1945, comemorando o centenário de nascimento de José Maria da Silva Paranhos. Em 1907, as lojas maçônicas de Niterói (Acácia, Evolução, Hiram, Liberdade, Igualdade e Fraternidade e Vigilância) escolheram a Itapuca para figurar no timbre de uma nova entidade - o Novo Grande Oriente do Brasil.
A Pedra de Itapuca abriga uma lenda na qual a índia Jurema manteve com o guerreiro Cauby uma aventura amorosa. Conta-se que Jurema estava prometida ao mais forte e bravo dos guerreiros de sua tribo, quando se deparou, um dia, com Cauby, de nação estranha. Desde então, nas noites de lua, Jurema cantava e Cauby a ouvia. Um dia, o romance foi descoberto pela tribo de Jurema, sendo os dois amantes atacados. Cauby, temeroso, fugiu. Curada dos ferimentos, Jurema nunca mais cantou. Muda e triste, permanecia na praia, todas as noites, chorando as saudades de Cauby até que, passadas seis luas, chegara a hora de seu casamento forçado com outro guerreiro de sua tribo. Na véspera, Jurema, mais uma vez, se dirigiu à praia e começou e cantar. Foi quando, saindo das águas, Cauby abraçou-a e os dois se deixaram ficar, protegidos pela lua, até que membros da sua tribo os cercaram, armados e enfurecidos. Na luta desigual, os amantes pagaram com a vida. Nesse momento, Tupã, a pedido de Jacy - a lua - abençoando o amor de Cauby e Jurema, transportou-os para o interior da pedra, onde permaneceram eternamente unidos.
Em 1985, o Instituto Estadual do Patrimônio Cultural - INEPAC - tombou a Pedra de Itapuca como monumento natural, através do processo E-03/33.538/83, de 9 de junho.


Retirado do livro "Niterói Patrimônio Cultural", editado pela SMC/Niterói Livros...

sábado, 7 de setembro de 2013

RUA FORA DO MAPA * ANTONIO CABRAL FILHO


Era jornal velho
e tinha o endereço
de um antiquário,
mas sua única alternativa
desde que ficou desempregado
era vender os pertences
dos seus avós falecidos.

Com o recorte na mão,
cruza a cidade imensa
cheio da pretensão
de vender a peça rara
para abastecer o lar
e livrar-se de aflições.

Rondou a cidade inteira
em busca da dita rua,
bebeu toda a água de pia
que lhe deixaram beber,
até não ter mais forças
atrás da Rua dos Artistas,
que nem havia no mapa.

É que a câmara da cidade,
através do Di Cavalcanti,
batizou a Rua das Artes
de Rua do Aleijadinho,
mas devido a um despacho,
ainda não consta
no roteiro da cidade.



quarta-feira, 28 de agosto de 2013

PRETINHA DO LEBLON * ANTONIO CABRAL FILHO


Sempre temi amores passionais. E os temo a ponto de policiar-me sobre o assunto. Por exemplo, certa vez namorei uma pretinha do Leblon que acabou comigo. Eu fiquei tão "cego de amor" que ficava na esquina esperando ela aparecer no calçadão aonde nós nos encontrávamos uma hora ou duas antes da hora marcada, e, quando ela despontava na avenida, eu me enfurecia de ódio, pelo fato de ter esperado tanto. Logo que se aproximava de mim, eu só faltava bater na menina, criando um monte de culpas pra acusá-la do meu sofrimento.
 Mas o pior foi no dia em que ela terminou comigo: Aquele "não dá mais, acabou, não quero te ver mais" incendiou-me! E tão logo ela deu-me as costas e entrou num ônibus, eu me senti a pior titica da face da terra. Só que nem eu contava com a desgraça de estar armado exatamente numa hora dessas: Parei um táxi, entrei dando o dinheiro ao motorista e ordenei que cercasse "aquele ônibus", e ao notar que o mesmo estava demorando a cumprir as minhas ordens, gritei "vamos logo!" com o 38 na mão. O taxista acelerou, encostou o DKV ao lado do motorista do ônibus e mandou ele encostar; saltei e entrei pela porta da frente, ordenando à menina "Vem comigo!". Ela passou, literalmente, sobre os passageiros deitados no chão do veículo e seguiu-me. Ficamos em torno de uma hora sentados na Praça Jardim de Alah, sem trocar uma palavra, até que ela levantou-se e partiu, deixando-me sentado lá...
Fiquei ali, desolado, não sei quanto tempo. Mas o mais interessante é que, durante toda aquela eternidade, não apareceu sequer um pm para prender-me por porte ilegal de arma, pois o 38 ficou sobre a mesinha de concreto aquele tempo todo, e, só por sorte, não apareceu viv'alma naquela praça, ao menos para despertar-me daquela letargia, até que dei-me conta, lentavei e parti... não sem antes jogar o "velho contra-poder" no leito do Canal do Jardim de Alah e jamais pegar em armas e apegar-me tanto a alguém.