sexta-feira, 29 de novembro de 2013

ETERNA CANÇÃO DOS BECOS * Antonio Cabral Filho

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Becos que canto no verso
sem fazer questão do metro
sem nenhuma pretensão
nem mesmo de sifilítico,

Becos das minhas certezas
e das ilusões perdidas
em leitos profissionais
nas vielas do Estácio,

Dos sarros bem tirados
no cine Pinto Azevedo
e tantas trepadas em pé
nas quebradas do São Carlos,

E tantas outras 
no campinho da Mineira
e outras tantas ainda
no Cemitério do Catumbi,

Sem contar as noites quente
com a Marisa do Charrão
no alto do Querosene
sobre uma esteira no chão.

Becos do Beco da Fome,
menina dos olhos de Copa bacana
e alegria de altos e baixos Leblons,
onde a fama do prazer
tira o atraso da galera.

Becos que ninguém cantou,
nem no dístico nem no tríptico
e quiçá numa quadra,
mesmo com elipses mentais,

Eu vos empresto minha alma,
mas com a mineira sisudez
em olhar só de soslaio
cá do Largo do Boiadeiro.
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sábado, 2 de novembro de 2013

LAVADEIRAS DO RIO DOCE * Antonio Cabral Filho

Todo dia bem cedo
Seguem levas de lavadeiras
Com as trouxas na cabeça.
Cada uma leva consigo
Um punhado de farofa no embornal
Para a boquinha necessária.
Todas possuem por costume
Vasto repertório de canções
Para a hora da esfrega,
Que entoam com voz meiga
Enquanto vão-se calmas
As águas do Rio Doce.
E as lavadeiras do Rio Doce,
Com suas canções de alvejar
Lavam a roupa mais alva
De que dão-se notícias
Por todas as redondezas
Espalhando tanta fama.
Mas isso pode ser visto
Na hora do sol a pino
Estendido nos varais.
É brancura de doer
As vistas do transeunte
Da BR 116,
E, segundo as línguas de trapo,
O boto tem sido acusado
De andar por aquelas bandas,
De ser o maior come-quieto,
Pois vive entoando canções
De enfeitiçar lavadeiras,
E possuí-las durante o sono
Sob os ingazeiros floridos
Perfumando o entardecer.
Enquanto lençóis branquíssimos
Brincam de pique com o vento
Nos sonhos das lavadeiras.