quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Poeta Virtual * Antonio Cabral Filho - Rj

Poeta Virtual
* Homenagem Ao Dia do Poeta Virtual 2016 *
***
Poeta Virtual

Vida é como definimos este espaço
entre o nosso nascimento e agora.

Mas poderia ter outro nome,
ou vários, como passagem, estada...

e muitos outros, sei lá, quem sabe...
enquanto tudo ocorre intempestivamente

à nossa margem, nessa caminhada,
por um caminho indelével

que não grava nossos rastros,
mas que capta nossas emoções,

como ondas elétricas nos ares,
até pegar em nossas mãos

e seguir junto em silêncio,
sem sabermos nada um do outro.

Isso lembra aquela brincadeira
do Amigo Oculto ao fim do ano

em que apontamos os eleitos
com detalhes imprecisos,

lhes cobrimos de mistérios
só pra dar-lhes um presente.

Eis a vida dos poetas,
seres transfigurados em anjos,

a servir amor em altas doses,
felizes com a felicidade alheia.

Antonio Cabral Filho - Rj/Brasil

*

sábado, 24 de setembro de 2016

Primavera * Antonio Cabral Filho - Rj

Primavera
***
*
"No silêncio do meu peito, Primavera",
sob o sol desta manhã,
meu amor foi fazer compras.
Pegou o cartão e saiu;
sequer um beijo me deu...

Restou-me o vento gelado
e sua navalha de Kubrick
passeando em minha pele,
mas nada que uma rosa
não resolva...

Súbito, chegou alvissareira,
com as mãos cheias de bromélias
e veio contar-me a história
de cada uma delas...
E fez nossa varanda
virar um jardim...

*

sábado, 17 de setembro de 2016

Maria dos Matadores * Antonio Cabral Filho - Rj

Maria Dos Matadores

-edouard manet-

As mães se banham de lágrimas
pelos filhos mortos em guerra,
mas quando eles sobram vivos,
e chegam cheios de glorias,
ostentam-nos, orgulhosas,
alheias a suas matanças.
E esse orgulho vira júbilo
se é viúva de milico
do tipo morto em combate,
qual uma espécie de vingança.

Mas algo muito esotérico
é o parente "puliça",
que expira poder pelos poros
e ameaça a todos por tudo.
"Mexeu com a pessoa errada"
ou "sabe com quem tá falando?",
estão sempre na ponta da língua.
Estes, são maridos
das viúvas de matadores.

E o contrário não é diferente,
bandido e "puliça" empatam
nos abusos do parente.
É um tal "vacilão, x-9"
que todo marginal resolve.

Mas deve-se isso tudo
à Maria Batalhão,
que confunde farda
com uniforme militar
e elemento armado
com homem de dignidade.
P'ela, basta um símbolo d'arma
que o eros entra em alerta.

E brotam desse limbo
as marias de cada porto,
as marias gasolina de toda esquina,
as marias chuteiras da beira de campo
e as marias - vai- com - as - outras
dos bandidos de toda espécie.

São como as prostitutas Maria;
maria sem pai, maria sem mãe,
maria sem filho, maria sem irmão,
que ninguém assume a prostituta maria.
Mas o filho caçula disso tudo
tem o nome de amor bandido
e foi com Maria Bonita
que ganhou status nas artes.

Desde então sobra maria
a trotoir na rol da fama
como heroína dos mocinhos.

Vejam as marias fujonas,
que não perdem a pegada
 de seus toureiros de Espanha:
fazem do canto do galo
a senha para fugirem
no seio da madrugada.

E tudo isso dura só
até o circo entrar na dança
com o palhaço por Cristo
como enredo das modinhas:
E o palhaço, o que é?
É ladrão de muié !

Como Orfeu não dorme no ponto, 
põe Pierrot em ação,
veste o lançador de facas
de mestre - sala
e de porta - bandeira,
a mocinha do picadeiro,
e bota o bloco na rua
cantando:"Mariazinha,
do bolo-bole, peitinho duro,
buceta mole"!

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sábado, 2 de julho de 2016

Futebol Tardio * Antonio Cabral Filho - RJ

Futebol Tardio

Futebol Tardio

Sempre à tardinha
quando o dia turva
jovens e adultos
buscam um campo
sempre de terra batida
com a bola embaixo do braço.

Vão pelos recantos
rumo aos arrabaldes
até ao lugar mais próximo
e se reúnem ao centro
para escolher os times.

Se inicia o jogo
e a bola rola serena
leve como uma pena
entre chutes e cabeçadas
sobre o campo esburacado.

Ninguém sabe o final
qual será o desfecho
desse jogo tardio
de atletas do acaso
enquanto a bola dança
seu balé sinistro
sobre esse chão tétrico,

ninguém distingue nela
e em seu vermelho-sangue
a cabeça do corpo anônimo
visto à beira da vala.

Mas o jogo tem fim
e ninguém sabe o placar
porque entre um pá-pá-pá e outro
o campo ficou deserto
e a bola sozinha
ao pé da trava
como a cabeça anônima
do corpo à beira da vala.

Antonio Cabral Filho
Rio de Janeiro - RJ/Brasil
antologiabrasilliterario.blogspot.com.br 

*

terça-feira, 7 de junho de 2016

Notícia de Jornal - Poema * Antonio Cabral Filho Rj


Notícia de Jornal

Muitos buscam notícias
Perguntando a terceiros,
Bisbilhotando um e outro,
Seguindo a velha arte das candinhas.

Outros ficam contritos
Ante o telejornal,
E há os que acordam cedo
E ficam, literalmente,
Ao pé do rádio,
Ouvindo ticos e tacos,
Depois saem dando furos pelos cotovelos,
Crentes que ouviram primeiro.

Mas eu não,  não sou assim,
Não tenho hora nem modus operandi
Em relação à notícia,
Pois sou leitor de jornal,
Convicto leitor de jornal,
Desde jornal de partido
Até ao pasquim mais marron.

De metrópole ou de província,
É a notícia de canto de página
Encontrada no folheio casual
Sem pretensão nenhuma
Que me acalma os sentidos.

Quem notaria esta chamada
TATU MORTO NA RIO – BAHIA?
Pensei na monstruosidade do crime,
Na Sociedade Protetora dos Animais,
Nos defensores de espécies em extinção
E conclui que não fazem-se mais
Ecologistas como antigamente.

Ao lado tinha um realese
Do Último Tango em Paris,
Fechado com a pergunta
Qual a marca da margarina
Usada pelo mocinho
Pra “sodomar” a mocinha.

Lia-se no resumo da matéria
“foi encontrado morto
Às margens da Rio – Bahia
Altura do km 112
40 anos presumíveis
O corpo de um homem
Cuja alcunha era...”

Meus Deus,
O tatu atropelado na Rio – Bahia
Não era o bicho,
Era um homem, Senhor! 

segunda-feira, 6 de junho de 2016

Canto Firmina * Antonio Cabral Filho - RJ

Canto Firmina


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Eu nunca fui a Cuman,
nas pegadas de Firmina,
nunca fui sentir a brisa
assim que o dia termina,

colher mensagens de amor,
trocar carícias ardentes,
tostar a pele com chamas
e lufadas de calor.

Eu nunca fui a Cuman,
atrás da mulher sonhada,
que faz daquelas areias
seu Reino de Caliban,

nunca fui chupar a uva,
sorver seu caldo na língua,
ouvir sussurros de Tétis
buscando seu Posseidon,

mas juro aos pés de Firmina,
para que Apolo não caia,
eu mergulho em suas águas
sem nunca morrer na praia.

*

quarta-feira, 23 de março de 2016

Fuzuê Dos Amantes * Antonio Cabral Filho - RJ

*
Fuzuê Dos Amantes

Pedro matou Tereza,
que o traía com José,
que morava com Maria,
que o traía com Geraldo,
que há oito anos prometia
casar-se com Marli,
que estava boiando na história.

Pedro foi para o Bangu 1,
Tereza para o inferno;
José está no purgatório
com Maria para cuidar
por ter ficado paralítica. 
Geraldo está no caminho.
Marli foi para o céu
com uma pneumonia
e deixou o Conde de Itabirito
monologando com o Pico do Cauê.

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domingo, 20 de março de 2016

Estória Para Contar * Antonio Cabral Filho - RJ

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Estória Para Contar

Essa estória 
de que o olho do dono
engorda o boi
está mal contada.

E para contá-la melhor
é preciso dizer a todos
que o olho do dono
além de engordar o boi,
engorda ainda o porco,
engorda o frango
e o carneiro também.

Mas o que ninguém sabe
é que o olho do dono
não engorda o concorrente
que vive de olho gordo
na saúde do seu rebanho,
nem engorda o empregado
que tem de ficar esperto
com a balança do plantel
e a usura do patrão
ou vai virar alpercata
para os pés da governanta.

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quarta-feira, 16 de março de 2016

Ócios Do Ofício # Antonio Cabral Filho - RJ

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ÓCIOS DO OFÍCIO

Vida de poeta
não é fácil;
construir o poema,
verso a verso
com ou sem jarda,
é como navegar
no mar de Ulisses,
cuja maré
sempre nos apronta
novas surpresas
e o ineficaz instrumento do vate
no labor perene com a peça
nunca concede a imagem explícita
na busca do metro exato
e nos larga no ponto final
sem duvidar da palavra,
prontos a fechar o poema
como quem fecha para balanço
(por motivos de força maior 
reabrirei segunda - feira)
ou como quem esmurra
o ubre da vaca
para que ela solte o leite
e guiar a pena linha a fora
sem deixar que o poema
encalhe nas figuras de retórica,
como se a palavra fosse rosa
e desabrochasse em flor
sem as carícias do sol.
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segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Glacê De Paz * Antonio Cabral Filho - RJ

Glacê De Paz
Desenho: www.brincadeirasdecrianca.com.br 
*
Por nada deste mundo
eu troco este momento,
aqui, sentado ao meio-fio,
me fartando na alegria do meu neto,
que joga bola na rua
junto com a criançada.

Mesmo com o corpo cansado,
cheio de dores musculares,
sem ânimo nem pra conversar,
não conheço felicidade maior
do que a meninada brincando,
alegrando a minha tarde de domingo
com seus coloridos e seus sons,
sua algazarra e gritaria -
vendaval de liberdade -
cobrindo a minha semana
com esse glacê de paz.

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